Enquadrado pela colina de Alfama a Norte e pelo Rio Tejo a Sul, o palácio conta a história das suas várias vidas, reveladas nas caraterísticas arquitetónicas dos diferentes elementos que o compõem. O processo deste projeto começa com a descoberta de vestígios arqueológicos da muralha romana e, pouco depois, da muralha moura e fernandina, construídas cada uma sobre a sua antiga ruína e, sobre elas, este palácio. Há outro elemento curioso neste projeto — o palácio é propriedade da família do cliente — que vem trazer uma abordagem singular. O cliente, sendo institucional, cria uma afinidade emocional com o projeto, resultando numa relação muito coesa entre as equipas, fundamental para reagir às adversidades enfrentadas ao longo dos anos.
Miguel Martins Santos esteve à conversa com Diana Nigra sobre os principais desafios deste projeto tão peculiar que viria a durar um total de oito anos.
Este é um edifício fantástico que tem mais de 300 anos e que está na posse da sua família há muito tempo. Gostava de começar justamente por aí – como é que surge esta ideia de reabilitá-lo e de convertê-lo? (Miguel Martins Santos)
O edifício foi mandado construir pelo Dom Francisco de Assis, quadragésimo quinto vice-rei da índia numa altura em que aqui, nesta zona ribeirinha, havia uma correnteza de palácios da alta aristocracia. Começava-se no Terreiro do Paço com o Palácio Real e a Casa da Índia, passando pela Casa dos Bicos, por este edifício em que nos encontramos e desembocando no Chafariz D’El Rei. Já o Arco de Jesus, acredita-se ter sido uma porta primitiva da cerca moura, pela qual Dom Afonso Henriques terá conquistado Lisboa. Veio parar à nossa família há muitos anos, a sua história é longa e complexa. O edifício inicialmente tinha apenas dois pisos e sofre com o terramoto, acabando por resistir. E passa, como vários outros palácios aristocráticos, por uma conversão em edifício para rendimento. Em torno do pátio, encontravam-se estas galerias, que conservamos, com vários apartamentos de pequena dimensão. Inicialmente o edifício tinha apenas dois pisos e, mais tarde, uma tia nossa acaba por adicionar mais dois pisos para acrescentar mais apartamentos de rendimento. Abandonado por largos anos, sentimos que estava na altura de dar-lhe uma nova vida. (Diana Nigra)
Este edifício está numa zona da cidade com uma espessura brutal. Considerámos que a reabilitação deste património merecia que deixássemos presentes as várias camadas. Por um lado, abóbadas, escadarias monumentais, traços claros do palácio antigo e, por outro, mantivemos a galeria de acesso nos pisos de acima e a métrica dos vãos. Dirias que assim contamos a história do edifício? (Miguel Martins Santos)
Estamos em cima da muralha árabe, romana e fernandina, com cinco metros de largura – imaginem o que é construir o que nós temos aqui com essa contingência! Quando fizemos o primeiro estudo arqueológico já sabíamos que iriamos encontrar alguma coisa, mas não tínhamos consciência da riqueza arqueológica. Foi uma obra extremamente difícil, mas foi muito bem entendido por todos logo ao início. Quisemos manter a memória do edifício, contar a sua história, mas trazendo o melhor dos confortos, os melhores acabamentos, para que quem venha habitar estes espaços sinta que vive num palácio com todas as facilidades e de hoje em dia. E, claro, conservámos também a sua portugalidade, deste pátio com galerias, uma espécie de pátio das cantigas, que traz outra camada da história do edifício. (Diana Nigra)
Os bons projetos fazem-se com boas equipas e aqui a equipa começa mesmo pelo cliente, pelo promotor. Sempre presente, sempre atento, a querer fazer parte da solução e não do problema. Nós aqui tivemos a sorte de ter não só o Henrique Polignac de Barros que é “doutorado” em imobiliário, como também a Diana que acompanhou de muito perto todo o processo. Como tem sido essa experiência? (Miguel Martins Santos)
De facto, não é usual, mas o promotor acompanhou de muito perto a obra. Tem sido realmente um curso intensivo de tudo! Foquei-me muito, o meu tio Henrique (Polignac de Barros) disse-me que só avançaria com a obra se eu me dedicasse a ela a tempo inteiro, de corpo e alma. E de facto, hoje em dia, posso dizer que este edifício é um bocadinho como um filho. Foi um processo de força de vontade, de resiliência, de paciência, mas também de uma aprendizagem imensa com o Fragmentos na parte de arquitetura, com o Engº Ricardo Sampaio na Engenharia e com a Udra. A primeira vez que nos encontrámos o Miguel disse que isto era um diamante em bruto e hoje estamos diante de um diamante lapidado, foi uma escola espetacular. Depois disto, tudo é possível! (Diana Nigra)
Conheça o projeto do Palácio do Tejo aqui.