Quando projetamos estamos a deixar a nossa marca nas vidas, nas cidades, no mundo. Projetar é sempre transformar – partir de algo que pode ser um desejo, uma vontade, um terreno e as suas condicionantes ou mesmo uma pré-existência. Podemos então dizer que os arquitetos fazem mundo? Tem em mãos ferramentas que permitem mudá-lo? Encerramos esta série no mês do nosso aniversário e convidamos as camadas mais jovens do nosso atelier a refletirem sobre este tema. Bruna Cardo Duarte, Diogo Ruivo, Joana Barros e Mariana Simões elencam algumas formas através das quais a arquitetura pode (e deve) mudar o mundo.
Podemos mudar o mundo?
Como arquitetos podemos mudar o mundo e temos a responsabilidade de fazê-lo da maneira certa. Tornar o mundo uma casa melhor para todos é uma responsabilidade e uma oportunidade que nos é dada. Nós projetamos casas, quarteirões, cidades e criamos ambientes que vão fazer parte da vida de todos nós. Isto tem de ser feito cuidadosamente! Porém, para falar da arquitetura como algo que nos permite transformar e mudar este nosso mundo, é também preciso falar de temas que vão para além do desenho. Nós, como arquitetos, estamos sempre à procura de soluções, faz parte da nossa profissão e acaba por acompanhar-nos depois no nosso dia-a-dia. O que é certo é que a arquitetura pode ser usada como uma forma de resolver problemas que não se esgotam no projeto — problemas sociais, económicos ou ambientais — e se tivermos isso em conta quando projetamos conseguimos garantir que a mudança que fazemos no mundo seja realmente positiva, seja para torna-lo melhor para todos. (Mariana Castro Simões)
Mudamos o mundo porque intervimos sobre ele, e é uma intervenção que perdura no tempo. É relevante ter em conta que a vida útil de um edifício é muito superior à vida de quem o projeta. Estamos sempre a desenhar para um futuro que desconhecemos. Não conseguimos definir hoje o que irá ser o edifício daqui a 50, 100 anos mas devemos garantir a sua adaptabilidade, seja através da sua estrutura, dos materiais que utilizamos, da forma dos espaços que estamos a criar… A adaptabilidade está intimamente ligada à sustentabilidade que é, hoje em dia, um tema muito importante na arquitetura. Não sei se iremos ou se devemos continuar a construir infinitamente e desenfreadamente, devemos pensar que o que desenhamos hoje irá servir as gerações futuras que poderão usufruir do edifício sem terem de construir outro no lugar dele. Esta é uma abordagem que privilegia a reabilitação e a adaptação dos edifícios, contribuindo para a preservação do património cultural e reduzindo os impactos económicos e ambientais inerentes à construção. Esta ideia da adaptabilidade também coloca alguma responsabilidade em quem vai habitar os espaços e a verdade é que, quando podemos exercer a nossa influência sobre um objeto, sobre um espaço, acabamos por criar uma relação com ele que nos leva a conservá-lo e a estimá-lo. (Bruna Cardo Duarte)
Nós, como arquitetos, efetivamente mudamos o mundo. Cada vez que projetamos estamos automaticamente a definir o que pode ser este nosso mundo no futuro. Não se trata aqui de poder mudar, isso fazemo-lo melhor ou pior todos os dias, mas sim de saber fazê-lo, de termos as ferramentas que permitem que o nosso impacto no território seja positivo e que a mudança que suscitamos no mundo o torne mais justo e mais sustentável. A arquitetura deve assumir sempre uma componente social e ter em conta a sua longevidade, a adaptabilidade que a Bruna referiu. Quando desenhamos um edifício devemos ter em conta que ele irá ter várias vidas e fará parte da nossa cidade durante muito tempo, muito mais tempo do que o tempo de vida de quem o projeta. O tema da longevidade e adaptabilidade também está intimamente relacionado com esta componente social — há vários projetos que desenvolvem esta vertente, onde o arquiteto assume um papel mediador perante um grupo de pessoas com poucos recursos. Face às vontades e às necessidades, não podendo naturalmente dar tudo de uma vez, já que os custos ultrapassariam os recursos disponíveis, o que entrega é uma espécie de folha em branco, um retângulo em que cada pessoa poderá, aos poucos, ir construindo a sua vida. E, talvez, se conseguirmos depurar a arquitetura àquilo que é o seu indispensável, o seu mínimo, conseguimos contribuir para uma sociedade que é mais desenvolvida por si própria e não condicionada pela forma como os arquitetos pensam. Atenção que sou arquiteta, mas diria que esta pode ser uma abordagem interessante! (Joana Barros)
Como arquitetos mudamos o mundo todos os dias. Um dos fatores preponderantes para que haja uma mudança de paradigma através da arquitetura é o reconhecimento dessa responsabilidade de intervir sobre o mundo. Na minha perspetiva, e numa altura em que já não há dúvidas do impacto ambiental da nossa profissão, acho importante que adotemos uma abordagem centrada na sustentabilidade. Diria que esta preocupação deve surgir desde o primeiro momento, quando conhecemos o local onde iremos projetar. Este terreno deve ditar, por exemplo, a escolha dos materiais, que devem ser locais, com menor pegada ecológica, mas também a forma do projeto e a sua relação com o exterior e a natureza. Fala-se cada vez mais do movimento de trazer a natureza para os nossos projetos e este é um gesto que considero muito importante e que tem efeitos claros nas várias escalas. A uma escala mais micro — nas fachadas, coberturas, através da inserção de pátios — mas também a nível urbano, levando elementos verdes às nossas praças e avenidas, criando cidades e ambientes mais biodiversos é certamente uma forma de criar um mundo melhor e melhorar a qualidade de vida de todos. (Diogo Ruivo)